IDENTIDADE
Quando penso na questão da identidade logo imagino quantas identidades cada um pode ter e penso também que a identidade está profundamente relacionada com o pertencimento. Identidade e pertencimento são temas controversos, considerando a imensa pluralidade do mundo e principalmente na velocidade da informação dos dias atuais, penso em quantas formas de viver, quantas ideologias podem, num “clique”, serem compartilhadas mundialmente. Entretanto nem é necessário ir tão longe para pensar sobre a identidade. Olhando para nós mesmos nos perguntamos qual a nossa nacionalidade, descendência, etnia, religião, raça (não me agrada o termo “raça”), ideologia política, sexo, orientação sexual, profissão, condição social, etc.
Apenas elencar a infinidade de identidades possíveis já não seria assim tão fácil, ainda mais no mundo tão volátil em que vivemos, ainda antes de terminar a lista, outras novas possibilidades de identidade já teriam surgido e outras já teriam caído no ostracismo. Por mais que uma identidade, seja qual for, possa parecer tão sólida e inabalável, não será assim para sempre.
Em 1895 Sigmund Freud deixa algum parecer de que a noção de identidade está ligada ao investimento das representações que buscam estabelecer vivência satisfatória, um “estado de identidade” que nos dê “semelhança” a fim de sermos aceitos por este ou aquele grupo a que pertencemos ou buscamos pertencer. Aproveito para lembrar que nenhuma escolha ou investimento estrutura-se apenas pelo consciente, aliás, bem menos que isso. E poderíamos ainda voltar um pouco mais e lembrar que se as principais estruturas psíquicas se iniciam desde a mais tenra infância, seria correto afirmar que nossa identidade também? Não pretendo falar sobre a mais tenra infância neste pequeno texto.
Quem somos e quem pretendemos ser e como apagar em nós traços daquilo já fomos e decidimos deixar de ser? Ou ainda, como criarmos novos traços e nos estruturarmos neles? Como apagar, criar, alterar nossa identidade diante de tantas “opções” que nos são apresentadas o tempo todo? A qual “tribo” pertencer? Encontrei no sociólogo polonês Zygmunt Bauman ideias nas quais me estruturei para escrever este pequeno texto.
Existem tantas dessas ideias e princípios em torno dos quais se desenvolvem essas “comunidades de indivíduos que acreditam” que é preciso comparar, fazer escolhas, refazê-las, fazê-las repetidamente, reconsiderar escolhas já feitas em outras ocasiões, tentar conciliar demandas contraditórias e frequentemente incompatíveis. (BAUMAN, 2004. P.17).
Julgo ainda necessário uma breve reflexão sobre todas as identidades que possuímos (ou que nos possuem), as que temos possuído em tempos passados e as que ainda possuiremos e, sendo tal reflexão sobre o real pertencimento, podemos possuir uma identidade que não nos pertence? As armadilhas das definições de identidade são inúmeras. Existem identidades genuínas, mas existem também supostas identidades, inclusive as que nos são impostas; Identidades efêmeras, bem integradas ou não, identidades que carregam princípios que não defendemos integralmente ou ainda em medida nenhuma. Acredito que a grande armadilha é quando “adquirimos” esta ou aquela identidade apenas para sermos aceitos, como já citado acima, por esta ou aquela comunidade cheias de ideais e princípios, por esta ou aquela “tribo”; a fim de não sermos tidos como estranhos e deslocados, pios isso pode ser muito desconfortável. Em uma era em que a comunicação é tão rápida e tudo é exposto aos olhos do mundo inteiro, não se faz necessário uma grande coleção de primaveras para que um indivíduo tenha contato expressivo com uma grande quantidade dos mais variados tipos de comunidades. Identidade e pertencimento são questões extremamente complexas e cada indivíduo deve navegar com cautela por esse oceano tão profundo. Mais uma vez me apoio em Bauman, sobre o que ele diz sobre tal complexidade.
Identidade é um monde de problemas e não uma campanha de tema único, é um aspecto que compartilho com um número muito maior de pessoas, praticamente com todos os homens e mulheres da nossa era “líquida moderna”. (BAUMAN, 2004, p18).
Por isso espero que o leitor não busque encontrar no final desse texto uma bússola que aponte para o melhor caminho diante desse mar de opções. Deixo aqui apenas uma reflexão sobre identidade e pertencimento. Deixo ainda um alerta, e esse era meu propósito inicial, para que tenhamos muito cuidado com as identidades com as quais, em algum momento, nos possam parecer “familiares”. Sobre esse alerta deixo algumas palavras de Bauman sobre o assunto.
As “identidades” flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta constante para defender as primeiras em relação às últimas. (BAUMAN, 2004, p.19).
A procura por uma identidade pode ser, por vezes, a procura por um descanso num sonho de pertencimento.
Adão Zambelli de Carvalho
Psicólogo.
CRP – 06/160959